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Sumário
Introdução
Agradecimentos
1 Mu
2 Joshu e o Grande Caminho
3 As perguntas do rei Milinda
4 Fazer o bem
5 Gokito
6 Tigelas
7 Presente de insultos
8 Kantaka e a teia de aranha
9 Sem pressa
10 A espada e a cerimônia do chá
11 Com fome, coma
12 Apenas duas palavras
13 Meditação e macacos
14 A lua
15 A perfeição
16 Poderes sobrenaturais
17 Cipreste
18 Paz mental
19 Musashi Sensei
20 Bolinhos de arroz
21 O ensinamento
22 Mudança
23 Equanimidade
24 A moeda da sorte
25 Uma analogia
26 Uma xícara de chá
27 Certo e errado
28 Céu e inferno
29 Verdadeira riqueza
30 É mesmo?
31 Proteger o Darma
32 O bambu e a lua
33 Venerável monge
34 A bela monja
35 A monja perseguida
36 A pedra no bambu
37 O carvão iluminado
38 Seguir após a morte
39 Você está?
40 Seppo e os macacos
41 A essência indestrutível
42 Dois monges
43 Águia azul
44 Pegar de volta
45 A senhora do chá
46 Mahaprajapati
47 Árvore sem sombra
48 Naropa
49 O ladrão
50 Sem palavras
51 A imagem sagrada
52 Conhecer a si mesmo
53 Causa e efeito
54 Atitude correta
55 Boas e más ações
56 Fome
57 Templo
58 Crítica e elogio
59 Cada pessoa tem sua própria boca
60 Para que serve?
61 Esvaziar-se
62 Impermanência
63 O Caminho e a morte
64 Roupas velhas e roupas novas
65 A meditação e o espelho
66 Filhos e filhas
67 Mais um passo
68 Abandone o abandonar
69 Abandonar o mundo
70 Palavras gentis
71 O que é Buda?
72 Virtudes e faltas
73 Relíquias de Buda
74 Nada a possuir
75 A decisão é sua
76 A cor da grama
77 Dúvidas e questões
78 Boas pessoas
79 Sementes
80 Canteiro de orquídeas
81 Cercas e pedregulhos
82 Arrogância
83 Pérolas de neve
84 Conselhos hábeis
85 Sem discussão
86 Tudo vem da terra
87 Bons conselhos
88 O bem e o mal
89 Sem ver e sem ouvir
90 O caminho fácil
91 Dívidas
92 Divisão de tarefas
93 Sem recompensas
94 Nobre silêncio
95 Fuja de Buda
96 Perda e ganho
97 Ouça, veja, obtenha
98 Portal do Dragão
99 Compaixão
100 A seda e a fome
101 Coração vazio
102 Desapego
103 Compreensão especial
104 O sentido do universo
105 A senhora e o monge
106 Derreta o gelo
107 O seu coração
108 A verdade suprema
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1 Mu
Um monge perguntou ao mestre Joshu:
— O cão tem natureza Buda?
O mestre respondeu:
— Mu.
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Esse Koan é chamado de primeira barreira. Disse o mestre Mumon:
— Se não ultrapassar esta barreira, se não cortar o caminho do pensar, você será como um fantasma se agarrando a arbustos e ervas daninhas.
Como ir além do pensar? Como se tornar um ser verdadeiro e não uma sombra de si mesmo, um fantasma que se agarra a coisa frágeis e supérfluas?
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2 Joshu e o Grande Caminho
Certa vez, um homem encontrou Joshu, que estava ocupado varrendo o pátio do mosteiro. Feliz com a oportunidade de falar com um grande mestre, o homem, imaginando conseguir de Joshu respostas para a questão metafísica que o atormentava, perguntou:
— Oh, mestre! Onde está o Caminho?
Joshu, sem parar de varrer, respondeu:
— O caminho passa ali fora, depois da cerca.
— Mas — replicou o homem, meio confuso — eu não me refiro a esse caminho.
Parando seu trabalho, o mestre olhou para ele e disse:
— Então, de que caminho se trata?
O outro falou, em tom místico:
— Falo, mestre, do Grande Caminho!
— Ahhh, esse! — sorriu Joshu. — O Grande Caminho segue por ali até a capital. — E continuou a varrer.
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3 As perguntas do rei Milinda
Durante uma conversa, o rei Milinda, que questionava sobre os ensinamentos de Buda, perguntou ao sábio Nagasena:
— O que é o samsara?
Nagasena respondeu:
— Ó grande rei, aqui nascemos e morremos, lá nascemos e morremos, depois nascemos de novo e de novo morremos, nascemos, morremos... Ó grande rei, isso é samsara.
Disse o rei:
— Não compreendo. Por favor, explique com mais clareza.
Nagasena replicou:
— É como o caroço de manga que plantamos depois de comer a fruta. Quando a grande árvore cresce, ela dá frutos, as pessoas os comem para, em seguida, plantar os caroços. E dos caroços nasce uma grande mangueira, que dá frutos. Desse modo, a mangueira não tem fim. É assim, grande rei, que nascemos aqui, morremos ali, nascemos, morremos, nascemos, morremos. Grande rei, isso é samsara.
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Se despertarmos para a natureza transitória de tudo o que existe, para a interdependência de cada ação, pensamento e palavra e formos capazes de nos libertar da ideia de um “eu”, nos livramos do sofrimento, da ansiedade, do culpar e penetraremos o Nirvana.
Nirvana é o extinguir, o cessar das oscilações da mente, do espírito. É o cessar das dúvidas e da confusão. É o clarificar a verdade e o caminho. É a libertação. Originalmente a palavra significa cessar o fogo por falta de madeira, de combustível. Cessar o fogo das paixões pelo aquietar da mente. Não colocar mais lenha na fogueira.
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4 Fazer o bem
Na China antiga, havia um monge zen que, para evitar adormecer durante o zazen (meditação sentada), decidiu fazer sua prática sentando-se nos galhos de uma árvore. Assim, se perdesse a atenção, cairia. Tornou-se conhecido pela sua singularidade, e muitas pessoas vinham pedir a ele ensinamentos e conselhos.
Ora, nessa mesma área existia um poeta célebre, Sakuraten, que, ao tomar conhecimento da fama do monge, decidiu ir testá-lo. Assim que chegou e o encontrou em zazen, no galho da árvore, falou:
— Tome cuidado, monge, é perigoso. Um dia o senhor poderá cair.
— Talvez — respondeu o monge —, mas o senhor corre maior risco do que eu.
Sakuraten refletiu:
— Com efeito, vivo no mundo, controlado pelas paixões. — Perguntou, então: — Qual é a verdadeira essência dos ensinamentos de Buda?
O monge respondeu:
— Não faça o mal. Faça o bem. Faça o bem a todos os seres.
— Mas até uma criança de 3 anos sabe disso! — exclamou o poeta.
— Sim, mas é uma coisa difícil de ser praticada até mesmo por um velho de 80 anos... — completou o mestre.
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5 Gokito
Certa ocasião, um senhor foi visitar um mosteiro zen e pediu ao abade:
— Mestre, venho pedir uma prece para mim, um Gokito de longa vida. Tenho visto a morte levar muitas pessoas conhecidas e próximas. Sei que também deverei morrer um dia. Portanto, por favor, faça um Gokito para eu viver por muito tempo.
— De acordo. Fazer um Gokito para viver muito tempo não é difícil. Quantos anos o senhor tem?
— Apenas 80.
— Ainda é jovem. Diz um provérbio japonês que até os 50 anos somos como crianças e que, entre os 70 e os 80, precisamos amar.
— Concordo plenamente. Então o senhor me fará o Gokito?
— Até que idade quer viver?
— Por mim, basta chegar até os 100 anos de idade.
— Seu desejo, na verdade, não é muito grande. Para chegar aos 100 anos, só precisa viver mais 20. Não é um período tão longo assim. E, sendo o meu Gokito muito exato, sua morte será exatamente aos 100 anos.
Amedrontado, o homem falou:
— Não, não! Melhor orar para que eu viva 150 anos!
— Atualmente, tendo chegado aos 80, já viveu mais da metade do prazo que deseja. A escalada de uma montanha exige grande soma de esforços e tempo, mas a descida é rápida. A partir de agora, seus derradeiros 70 anos passarão como um sonho.
— Nesse caso, peço para viver 300 anos!
O monge respondeu:
— Como seu desejo é pequeno! Somente 300 anos! Diz um provérbio antigo que os grous[1] vivem mais de mil anos e as tartarugas, 10 mil. Se animais podem viver tanto assim, como é que o senhor, um ser humano, deseja viver apenas 300 anos?
— Tudo isso é muito difícil... — tornou o homem, confuso. — Para quantos anos de vida pode ser feito um Gokito?
— Quer dizer, então, que o senhor não quer morrer? Que atitude egoísta... — replicou o mestre.
— Bem, tem razão... — respondeu o ancião, constrangido.
— Assim sendo, o melhor é fazer um Gokito para não morrer.
— Sim, é claro! E pode ser? Esse é o Gokito que eu quero! — falou o senhor, animado.
— É muito caro, muito, muito caro, e leva muito tempo...
— Não faz mal — concordou o homem.
O mestre então disse:
— Começaremos hoje entoando apenas o Makka Hannya Haramita Shingyo (Sutra[2] do Coração da Grande Sabedoria Perfeita). Em seguida, todos os dias, o senhor deverá vir fazer zazen no templo. Pronunciarei, então, palestras em sua intenção.
Dessa maneira, de forma suave e indireta, o monge conseguiu fazer com que o homem deixasse de se preocupar com o dia de sua morte e o conduziu à prática dos ensinamentos do Darma de Buda.
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6 Tigelas
Certa vez um discípulo perguntou ao mestre Joshu:
— Mestre, por favor, o que é o despertar?
Joshu respondeu:
— Você já terminou de comer?
— Sim, mestre, terminei.
— Então, vá lavar suas tigelas!
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7 Presente de insultos
Certa vez existiu um grande guerreiro. Embora idoso, ainda era capaz de derrotar qualquer desafiante. Sua reputação estendeu-se longe e amplamente através do país e muitos estudantes reuniam-se para estudar sob sua orientação.
Um dia um infame jovem guerreiro chegou à vila. Ele estava determinado a ser o primeiro homem a derrotar o grande mestre. Junto à sua força, ele possuía uma habilidade fantástica em perceber e explorar qualquer fraqueza em seu oponente, ofendendo-o até que este perdesse a concentração. Ele esperaria então que seu oponente fizesse o primeiro movimento, e assim revelando sua fraqueza, atacaria com força impiedosa e velocidade de um raio. Ninguém jamais havia resistido a ele além do primeiro movimento.
Contra todas as advertências de seus preocupados estudantes, o velho mestre alegremente aceitou o desafio do jovem guerreiro.
Quando os dois se posicionaram para a luta, o jovem guerreiro começou a lançar insultos ao velho mestre. Ele jogava terra e cuspia em sua face. Por horas, verbalmente ofendeu o mestre com todo o tipo de insulto e maldição conhecidos pela humanidade.
Mas o velho guerreiro meramente ficou parado ali, calmamente.
O jovem guerreiro ficou exausto.
Percebeu que tinha sido derrotado, e fugiu envergonhado.
Um tanto desapontados por não terem visto seu mestre lutar contra o insolente, os estudantes perguntaram:
“Como o senhor pôde suportar tantos insultos e indignidades?
Como conseguiu derrotá-lo sem ao menos se mover?”
“Se alguém vem para lhe dar um presente e você não o aceita,” o mestre replicou, “para quem retorna este presente?”
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Não aceitar os insultos que nos fazem é uma arte. Geralmente nos ofendemos e ao ficarmos ofendidas reagimos.
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8 Kantaka e a teia de aranha
Kantaka era um homem mau. Sem a menor piedade, matava e roubava. Não perdoava nem mesmo filhotes recém-nascidos, tal a sua maldade.
Certo dia, estava passando por uma estrada e viu uma aranha no chão. Pela primeira vez na vida, ele se desviou da aranha e a deixou viver. Ele que, desde criança, arrancava as pernas dos insetos e esmagava quem estivesse à sua frente.
Kantaka morreu, e seu carma prejudicial era tanto que ele foi imediatamente para os reinos de grande sofrimento. Não estava só. Havia um grande número de outros seres sofrendo calores terríveis e frios medonhos. Física e mentalmente perturbados. Assim sofria Kantaka o resultado de todas as suas más ações, quando, de repente, viu uma aranha descendo por um fio de prata. A aranha se aproximou de Kantaka e o convidou a subir pela sua teia.
— Mas é muito fina e frágil — hesitou ele.
— Tente — disse a aranha. — Você não pisou em mim quando estava caminhando na estrada. Por causa dessa boa ação sou capaz de levá-lo a um local melhor do que este.
Sem mais nada a perder, Kantaka se agarrou àquele finíssimo fio e começou a subir. Estava contente. Ia se livrar dos infernos. Nisso, sentiu o fio tremer. Olhou para baixo e outros seres em sofrimento tentavam se agarrar à teia da aranha. Temendo que o fio não aguentasse outras pessoas, Kantaka começou a chutar a cabeça dos que tentavam subir. E o fio se partiu.
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9 Sem pressa
Um discípulo foi ao seu mestre e disse fervorosamente:
— Eu estou ansioso para entender seus ensinamentos e atingir a iluminação! Quanto tempo vai demorar para eu obter esse prêmio e dominar esse conhecimento?
A resposta do mestre foi casual:
— Uns dez anos...
Impacientemente, o estudante completou:
— Mas eu quero entender todos os segredos mais rápido do que isso! Vou trabalhar duro! Vou praticar todos os dias, estudar e decorar todos os sutras. Farei isso dez ou mais horas por dia! Nesse caso, em quanto tempo chegarei ao objetivo?
O mestre pensou um pouco e disse suavemente:
— Vinte anos.
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10 A espada e a cerimônia do chá
Um mestre da cerimônia do chá, no Japão antigo, certa vez ofendeu um samurai, ao distraidamente desdenhá-lo quando ele pediu sua atenção. O mestre rapidamente pediu desculpas, mas o altamente impetuoso samurai exigiu que a questão fosse resolvida em um duelo de espadas.
O mestre de chá, que não tinha absolutamente nenhuma experiência com espadas, ficou arrasado. Lembrou-se de um amigo, praticante zen, também grande conhecedor da arte da espada. Convidou-o a tomar chá. Quando o amigo chegou, já tinha tudo preparado para a cerimônia. A água fervia na temperatura correta e a sala estava impecável.
Enquanto o mestre de chá fazia a cerimônia, o praticante zen notou que ele executava sua arte com perfeita concentração e tranquilidade.
— Amanhã — disse —, quando for duelar com o samurai, prepare-se assim, como se fosse fazer uma cerimônia de chá. Tranquilo e sereno. Quando seu oponente chegar, segure a espada sobre sua cabeça, como se estivesse pronto para desferir um golpe e encare-o com a mesma concentração e tranquilidade com a qual executa a cerimônia do chá.
No dia seguinte, na exata hora e local escolhidos para o duelo, o mestre de chá seguiu o conselho. O samurai, pronto para um duelo, olhou por muito tempo em silêncio para a face atenta porém suave e calma do mestre de chá. Finalmente, sem nem mesmo sacar a espada, pediu desculpas pelo mal-entendido e se foi.
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